sábado, 7 de março de 2020

Dia 8 de março - Dia Internacional da Mulher - "Leituras de porta em porta"






No âmbito do Dia Internacional da Mulher, a Biblioteca Escolar dinamizou mais um “Leituras de porta em porta”. À semelhança do que é habitual, os alunos monitores tiveram um papel ativo e muito importante na distribuição dos textos à comunidade escolar – professores, Assistentes Operacionais e Assistentes Administrativos.
Desta vez, e dado que, em princípio, este ano se realizarão os Jogos Olímpicos de Tóquio, o excerto escolhido aborda a participação das mulheres, ao longo do tempo, neste importante evento desportivo.
O livro “Deusas e Guerreiras dos Jogos Olímpicos” está disponível na Biblioteca Escolar da ESGB.

Leia o texto que segue após as fotos.












Jogos Olímpicos – Participação das mulheres

1.    Jogos Olímpicos da Era Antiga

A origem dos Jogos Olímpicos (JO) permanece incerta, mas todas as lendas olímpicas apresentam um ponto comum: os jogos como manifestações religiosas e culturais.
São várias as lendas, e versões de historiadores, que tentam enquadrar e datar os JO da era antiga realizados no que hoje conhecemos como Grécia.
Uma das lendas refere que foi Zeus quem fundou os JO para festejar a sua vitória contra Cronos.
Segundo Homero, o seu criador foi Pélops (1500 a.C.), filho de Tântalo, deus da fertilidade e avô de Hércules, que, para conseguir a mão da filha do rei Oneramos teria de ganhar uma corrida de cavalos. Alcançando o seu objetivo, celebrou a vitória consagrando os jogos a Zeus. (…)
Os jogos de Olímpia, assim com outros jogos pan-helénicos, e o desporto em geral, têm raízes nos rituais fúnebres de morte e renascimento de forças vitais da terra, origens no domínio do sagrado, e eram celebrados na proximidade de sepulturas de heróis, com a de Pélops, em Olímpia. Sendo que a Grécia não correspondia a um estado mas a uma série de cidades-estado e de colónias, os jogos pan-helénicos reuniam o mundo grego, partilhando-se o sentimento de pertença a uma mesma cultura ou religião. Além de festival religioso tinham como objetivo mostrar as qualidades físicas dos seus atletas e o estádio substituía, temporariamente, o campo de batalha. (…)
O desporto grego, parte do destino de todos os homens jovens, congregava três objetivos: um social – formar homens, física e psicologicamente perfeitos, que contribuíssem para a vida política e religiosa da polis; outro de ordem militar, formar cidadãos fortes, capazes de combater; e um terceiro, mítico, associado ao sagrado, ao divino.
Independentemente de quem foi o fundador dos JO, o certo é que, na era antiga, os jogos se realizaram entre 776 a.C. e 393 d.C.

Aspetos da organização dos Jogos Olímpicos

Em termos organizativos, o auge dos JO parece ter ocorrido no século V a. C..
Os jogos tinham lugar no fim do mês de julho ou no início de setembro. Se inicialmente se realizavam apenas num dia, a sua duração foi-se alargando até aos 7 dias, assim como foram aumentando o número de disciplinas em concurso. Estabelecida a data, os mensageiros anunciavam a trégua sagrada que, pelo menos teoricamente, abria um período sem conflitos, antes, durante e após os jogos, entre os gregos. A trégua, de um mês, permitiria que os atletas e todos os interessados se deslocassem em segurança para o local dos jogos, um clima de paz durante os mesmos e permitiria ainda que os vencedores fossem homenageados e adorados quando regressassem às suas cidades. (…)
Deviam ainda, (os atletas) um mês antes das provas, concentrarem-se em Olímpia para treinarem no hipódromo, na palestra, no ginásio ou no estádio – a última fase de qualificação para os jogos. Dois dias antes do início dos JO, os atletas, treinadores, embaixadores, sacerdotes, etc. concentravam-se em Elis e organizava-se o cortejo olímpico em direção a Olímpia, um percurso de 300 estádios (cerca de 57 Km); a entrada na cidade assinalava o primeiro dia dos jogos.
O programa olímpico era constituído, inicialmente, apenas pela corrida de velocidade à qual, com o tempo, se foram juntando outras disciplinas, mas sempre individuais:
Corrida (…); Luta livre (…); Boxe (…); Salto em comprimento (…); Lançamento do disco (…); Lançamento do dardo (…); Pancrácio, forma primitiva de arte marcial que combinava luta e boxe (valia tudo menos tirar olhos, morder e pôs os dedos no nariz do adversário); Pentatlo (…); Provas equestres, corridas de cavalos e de carros, sendo a corrida de quadrigas a mais espetacular. (…)
Os Jogos eram encerrados ao sétimo dia, com cerimónias sagradas. Os vencedores recebiam uma palma e uma coroa de oliveira e, em cortejo, dirigiam-se ao teatro onde era cantado um hino em sua honra e largados pombos anilhados para que o nome dos vencedores fosse conhecido no mundo grego.

E as mulheres nos JO da antiguidade?

O regulamento olímpico era bem claro quanto às mulheres nos Jogos: interdição por motivos religiosos. As mulheres, casadas, solteiras e as jovens eram excluídas das provas, assim como de muitos momentos da vida pública, nem tampouco podiam assistir aos Jogos. A violação das regras era punida com a morte: as prevaricadoras eram atiradas do rochedo Tipaion. Os Jogos eram interditados também aos não-gregos, estrangeiros, escravos e aos condenados. (…)
Porém, as mulheres solteiras e as raparigas tinham os seus jogos – Jogos de Hera. Hera, mulher e irmã de Zeus, rainha das divindades Olímpicas, era deusa do casamento e do nascimento.
Estes Jogos, realizados também de quatro em quatro anos, e celebrados em honra da deusa, eram organizados e supervisionados por um comité constituído por 16 mulheres.
Os jogos femininos, tal como os masculinos, tinham um fundamento mítico e religioso, e a corrida (160 metros), no estádio, por categorias – crianças, adolescentes e jovens – era a sua única prova.
Corriam com os cabelos soltos e usavam uma túnica até aos joelhos, com o ombro direito descoberto até ao seio (símbolo do sol).
As vencedoras recebiam também uma coroa de oliveira, uma parte da vaca que era sacrificada em honra de Hera e romãs, símbolo de fertilidade. (…)
Se não nos centrarmos apenas nos JO e nos Jogos de Hera, há notícia de outros jogos para mulheres como, por exemplo, em Esparta: duas sociedades femininas (as Leicípedes e as Dionísias) realizavam uma corrida na montanha. O exercício físico fazia parte da educação das espartanas, ainda que o seu objetivo fosse eugénico. Praticariam também luta e não lutariam apenas entre elas, mas também com os rapazes.(…)
Kallipateira (440 a. C.) deve ter sido a primeira treinadora na história do desporto. Por morte do seu marido, treinou o filho, Peisirodos, e, disfarçada de homem, tomou o lugar destinado aos treinadores. Após a vitória de Peisirodos e com a excitação deixou cair o disfarce. Por ser filha, irmã, prima e mãe de vencedores olímpicos foi poupada de ser lançada do Tipaion.
A partir deste incidente foi determinado que os treinadores deviam participar nus nos jogos, tal e qual os concorrentes.(…)
Com mais ou menos restrições o exercício físico não estaria de todo interdito às mulheres; a grande restrição parece ser os JO. Mas julgamos que é permitido sublinhar um aspeto que eventualmente influenciaria, e muito, os propósitos da prática desportiva das mulheres, durante séculos – a atividade física como meio de as tornar saudáveis e fortes para a procriação, circunscrevendo os papéis das mulheres à maternidade e à esfera doméstica.

A influência do ideário de Coubertin no desporto feminino

(…) No seu longo mandato (29 anos) à frente do Comité Olímpico Internacional (COI), Coubertin não concebia mulheres em competições onde participassem homens; (…) São por demais conhecidas algumas das suas posições:
. Uma Olimpíada com mulheres seria irrealista, sem interesse, inestética e imprópria - … seria uma pseudo Olimpíada;
. quanto à participação feminina nos Jogos, sou totalmente contra;
. é contra a minha vontade que as mulheres sejam admitidas a um número de provas cada vez maior;
. continuo a pensar que o contacto com as atletas é prejudicial (para os atletas), e que este atletismo deveria ser excluído do programa Olímpico;
. o único herói Olímpico é o atleta individual adulto. Assim nem mulheres, nem desportos de equipa.

Não é possível deixar de assinalar que o Barão considerava interessante que as mulheres, enquanto esposas, apreciassem os prazeres desportivos dos maridos e, enquanto mães, orientassem a educação física dos seus filhos. Atitudes paternalistas como esta, um antifeminismo primário, a defesa da superioridade branca e o apoio mais ou menos declarado ao nazismo foram tirando protagonismo e poder a Pierre de Coubertin. Retirou-se para a Suiça, sem fortuna, morrendo em 1937, em Genebra.

2.    As mulheres nos Jogos Olímpicos

Feminização dos desportos e provas no programa olímpico

Quase tão lenta como a evolução do número de mulheres atletas nos Jogos foi a introdução no programa
olímpico dos desportos e provas que lhes foram sendo permitidos.
            Durante os primeiros 75 anos do século XX, as oportunidades das mulheres foram frustradas pelo fanatismo e ignorância de alguns dirigentes desportivos e pela noção errada de que as mulheres eram muito frágeis para praticar desportos ou que a capacidade atlética era incompatível com a “verdadeira” feminilidade. Durante décadas, apenas foi permitido às mulheres a competição olímpica num reduzido número de desportos e de provas.(…)
            Se considerarmos que grande parte do atual programa olímpico foi definido nas primeiras cinco olimpíadas (1896 a 1912) as mulheres tiveram de esperar 100 ou mais anos para poderem competir em provas como, por exemplo, o Triplo Salto, Salto com Vara e Lançamento do Martelo, Sabre (Esgrima); Halterofilismo, Luta Livre, Pólo Aquático ou Fosso Olímpico (Tiro). Esperaram entre 84 e 96 anos para serem autorizadas a competir nas provas de Ciclismo em Pista ou em Estrada (…) e na Maratona.
            A inclusão desta última prova nos eventos femininos, em 1984, parecia ser capaz de derrubar o mito da fragilidade dos corpos das mulheres.
            A progressão dos recordes nesta distância, alcançados por homens e por mulheres, mostra-nos que os corpos das mulheres são poderosos e capazes de sempre se superarem. Com efeito, enquanto os maratonistas, em 94 anos, melhoraram o tempo na distância em 50 minutos, as atletas da maratona em 77 anos conseguiram tirar 1 hora e 25 minutos ao tempo necessário para percorrer os 42,195 metros.
           
Cruz, I., Silva, P., Gomes, P. (2006). Deusas e guerreiras dos Jogos Olímpicos. Lisboa: Comissão para a Igualdade e para os Direitos das Mulheres.




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