sexta-feira, 14 de dezembro de 2018

"Os Meus Irmãos Refugiados" - Texto para o Natal na Biblioteca Escolar


Aqui fica um excerto do texto "Os Meus Irmãos Refugiados" o texto que esteve em destaque neste Natal na Biblioteca Escolar da ES Gama Barros.




“Os meus irmãos refugiados”
A Miriam ia muito contente, saltitando pela rua de mão dada com a mãe. Gostava de ir assim, de manhãzinha, até à escola. A mãe levava o bebé ao colo; era tão pequenino que mais parecia um boneco. “Tão querido!”, pensou ela. O avô, já velhote, ficara em casa, e o pai, médico, saíra como sempre a correr, muito cedo, para o trabalho no hospital. A Miriam sentia-se especialmente contente porque o irmão mais velho, que estava na tropa, ia chegar para umas férias em casa. Ela gostava de o ver, alto e bonito na sua farda. Apesar de já ser grande ele era superdivertido, brincava com ela e tinha sempre imensas histórias para contar.
Mas naquele dia tudo foi diferente…
Quando chegaram, a escola estava fechada. Havia pais e professores à porta. Os adultos falavam baixo, mas via-se que estavam nervosos. Por todo o lado só se ouvia uma palavra: “Guerra!”
A Mãe voltou para casa muito depressa, e a Miriam corria ao seu lado perguntando:
- O que foi? O que aconteceu?
Ela sabia que havia uma guerra, mas era muito longe, não era?
Quando chegaram, o avô, com a voz a tremer, anunciou:
- O Youssef já não vem, há combates nas montanhas onde ele está. E também explodiram bombas no outro lado da nossa cidade.
- Oh meu Deus! – gemeu a mãe.
O avô continuou, tentando manter a calma:
- Os telefones não funcionam, não consigo falar para o hospital. A guerra está a aproximar-se, temos de fugir!
A Miriam desatou a chorar.
Por vezes os pais falavam da guerra, e todos tinham uma mala pequenina debaixo da cama, pronta “para uma emergência”, como eles diziam. Mas ela brincava, ia à escola e não pensava em coisas tristes. A guerra era uma coisa má que acontecia lá longe.
Ela não queria sair da sua casa. Nem tinha dito adeus à Bibi, a sua melhor amiga.
E o pai?! Oh, não, o pai! Não podiam ir sem ele!
A mãe tinha lágrimas nos olhos, mas uma expressão corajosa, quando explicou:
- Temos de ir. O pai sempre disse que não podia abandonar os seus doentes, e agora, com a guerra, vai haver mais feridos, e um médico aqui ainda vai ser mais necessário. O avô leva-nos para casa dos primos, no Norte. O pai sabe para onde vamos e vai ter connosco logo que puder. A Miriam tentou ser corajosa como a mãe, ajudando a buscar as malas e a empacotar o máximo de comida possível em caixas de papelão.
O avô saiu e voltou com más notícias:
- Não podemos ir de carro. As estradas estão um caos e dizem que a gasolina está a acabar em todo o lado.
Como em resposta, ouviram um “hin-hon” no quintal das traseiras. O velho burrico! Que grande ajuda.
A Miriam ajudou o avô e a mãe a pôr tudo na pequena carroça que o pai tinha andado a reparar nos fins de semana. Não levavam muita coisa, mas mesmo assim o espaço era apertado.
Antes de partir, deu uma volta pela casa. Ficavam para trás os móveis, os brinquedos e tantas recordações! No último momento, ainda pegou na sua boneca preferida e numa fotografia em que toda a família ria, muito feliz.
Todos juntos, deram as mãos e, de lágrimas nos olhos, rezaram pela paz, pedindo a Deus que protegesse o pai, o Youssef, e tantos amigos em perigo.
A seguir, com novo ânimo, Miriam subiu para a carroça e puseram-se a caminho. Havia muita gente apressada a correr pelas ruas. Carros buzinavam, em longas filas, mas como a carroça era pequena, o avô conseguiu conduzi-los para fora da cidade. Na estrada, o trânsito seguia lentamente. Na berma viam-se famílias em volta dos carros parados com o motor avariado ou pneus furados. Muita gente seguia a pé, sobretudo mulheres de ar cansado, com trouxas à cabeça e crianças pela mão.
Havia refugiados de todas as religiões. Alguns eram cristãos, como a família da sua amiga Bibi, mas a maioria eram muçulmanos. Miriam procurava-a, olhando com atenção para todos os lados, mas era impossível descobri-la no meio de tanta gente. No entanto, tinha a certeza de que um dia viriam a encontrar-se. A Bibi teria sempre um lugar especial no seu coração.
Quando viram dois pequenos perdidos, o avô desceu e deu-lhes o seu lugar na carroça. Eram mais dois para dividir a comida mas não podiam deixá-los para trás. Tinham só 3 e 5 anos. Uma bomba tinha destruído a sua casa e não sabiam onde estavam os pais.
No seu banco de madeira, sacudida ao ritmo da passada do burrico, Miriam ia triste, mas percebia como a sua família tinha sorte, comparada à de tantos outros.
Até que surgiram notícias terríveis. O Norte também estava sob ataque. Os tios e os primos certamente também tinham fugido de casa.
Para onde ir? Cada pessoa na estrada dava uma opinião diferente.
O avô ouviu dizer que junto da fronteira com o país vizinho estavam a preparar campos de refugiados.
- É o que nós somos – disse ele tristemente -, refugiados de guerra. É para lá que vamos. Talvez nos possam ajudar.
O caminho era longo. Miriam e os dois rapazinhos morriam de calor durante o dia, tinham sede e a comida que tinham levado já era pouca. À noite encolhiam-se no chão junto à carroça abraçados uns aos outros para se protegerem do frio. (…)
Será que iam mesmo encontrar ajuda? E o pai e o Youssef, onde estariam? E como se iriam voltar a reunir?...
Por vezes, o medo de não os voltar a ver era tão grande que não conseguia evitar chorar. Mas todas as noites dava as mãos à mãe e ao avô, rezavam juntos e o seu coração acalmava. Deus havia de mandar-lhes auxílio!
Muito longe, quase no outro lado do mundo, Pip voltava a correr do jogo de futebol. Entrou em casa e gritou:
- Ganhámos!
Tinha o cabelo despenteado e ainda estava corado de excitação.
A mãe estava na sala a ver as notícias na televisão. Sorriu-lhe e abraçou-o, dando-lhe os parabéns, mas via-se que estava triste. Tinha o terço entre as mãos.
- Que se passa? – perguntou o Pip preocupado.
- Mais guerra no mundo, meu filho, mais razões para rezarmos. Gostava tanto de fazer alguma coisa para ajudar!
- Tu rezas tanto, mãe. Isso já é uma grande ajuda! – disse o Pip para a consolar.
“A mãe é tão boa, o seu coração é do tamanho do mundo!” – pensou ele.
Pip deu-lhe um beijinho na bochecha.
Nesse instante aparecia na televisão a imagem do Papa, vestido de branco. Aumentaram o som e ouviram só as últimas palavras: “Acolher os refugiados”, “acolher os refugiados”, “acolher os refugiados”…
Aquelas palavras pareciam ressoar na sala.
- Temos uma casa tão grande – sussurrou a mãe.
- O meu quarto tem uma cama a mais – respondeu o Pip.
- Podíamos acolher refugiados! – exclamaram os dois ao mesmo tempo.
Abraçaram-se emocionados. Era isso que iam fazer. Iam oferecer-se para receber uma família inteira!
Naquele momento, a televisão mostrava centenas de refugiados a encaminharem-se para um enorme campo de tendas e contentores metálicos. Havia filas de pessoas doentes em frente e uma tenda gigante com uma cruz vermelha no alto, onde médicos voluntários trabalhavam sem parar. Noutra fila, viam-se milhares de pessoas com uma lata na mão, à espera de comida. Uma jovem sorridente servia o que parecia ser uma sopa e entregava um pão e uma fruta a cada um.
De repente, a TV mostrou a cara de uma menina morena de grandes olhos verdes. Levava pela mão dois rapazinhos. Atrás ia um velhote e uma mãe com um bebé ao colo.
- Como te chamas? – perguntou-lhe o repórter.
E ela respondeu, com um sorriso de dentes brancos a iluminar a cara muito suja:
- Miriam!
Passou algum tempo. O Pip foi com a mãe inscrever-se no centro de apoio aos refugiados que funcionava na sua paróquia. Deram os nomes e a morada. Depois, uma senhora simpática que dirigia o serviço foi visitar a casa deles para se conhecerem melhor. Mas tinham de esperar, porque havia muitos papéis e coisas complicadas a tratar.
Um dia disseram-lhes que havia uma família pronta para chegar! Tinham passado tempos muito difíceis, procurando o pai, que ficara na cidade, e o irmão, que fora ferido na guerra, mas finalmente tinham-se reunido num campo de refugiados.
- É um milagre – dizia o senhor prior. A cidade onde viviam e grande parte do país tinham ficado destruídos, os telefones e a internet não funcionavam, muitas estradas estavam cortadas e as pontes tinham sido derrubadas, mas Deus tinha ajudado e estavam todos juntos, prontos para começar uma vida nova num país que os recebesse.
- E são boas pessoas – acrescentava o senhor prior. – Salvaram a vida de duas crianças que estão agora numa casa onde os mais pequenos são tratados com muito carinho.
Felizmente, o pai da família e o filho mais velho falavam um pouco de inglês, o que tornaria mais fácil comunicarem e ajudaria à adaptação de todos.
Pip e a mãe lançaram-se ao trabalho, cheios de entusiasmo. Era preciso preparar a casa para a chegada de tanta gente, e queriam que todos se sentissem bem recebidos.
Os vizinhos emprestaram uma caminha para o bebé, que ia ficar com os pais no quarto de hóspedes. A mãe pintou de branco o escritório, trocou o sofá por duas camas estreitas com colchas de cores alegres, e muitos livros que já tinham sido lidos foram oferecidos à biblioteca pública, tornando-se as estantes num belo armário para o avô e o filho mais velho.
Finalmente, puseram uma parede a dividir em dois o grande quarto do Pip, e ele dedicou-se durante vários dias para receber uma menina.
_ Nunca vi o teu quarto tão limpo e arrumado – elogiou a mãe.
- É verdade, agora são dois quartos mais pequenos, mas até estão giros, não estão? Pus as chuteiras que cheiravam a chulé no armário das vassouras – riu o Pip. – E tirei da parede alguns cartazes de futebol para ela colar o que quiser. Mas aposto que vai pôr umas coisas horrorosas todas em cor-de-rosa.
Fez uma careta perante a ideia, mas logo a seguir abriu-se um sorriso de orelha a orelha.
Na verdade, achava divertido ter pela primeira vez uma rapariga em casa. Seria como ter uma irmã mais nova.
No dia combinado, o Pip e a mãe foram ao aeroporto com a senhora do serviço de apoio aos refugiados, levando um cartaz com um nome esquisito escrito em letras grandes.
Pip sentia-se nervoso e ao mesmo tempo feliz. Lembrou-se do Papa na televisão a dizer: “Acolher os refugiados.”
“Ele ficaria contente se soubesse” – pensou.
De repente, a senhora começou a acenar e a chamar:
- Lá vêm eles! São eles!
Pip viu um casal moreno, empurrando um carrinho de bagagens sobre o qual vinha um bebé sorridente. Um rapaz novo de muletas coxeava ao lado de um velhote com ar simpático. E uma menina de grandes olhos verdes, um pouco tímidos, saltitava de excitação, olhando para tudo com ar de espanto.
“E agora?” – pensou sobressaltado. – “Nem sequer falamos a mesma língua!”
A família aproximou-se. A menina correu e foi a primeira a chegar ao pé deles.
Pip apontou para si próprio e disse numa voz feliz:
- Pip!
E ela apontou para si própria e respondeu contente:
- Miriam!


Ameal, Theresa, in Os meus irmãos refugiados – Amigos do outro lado do mundo. Lisboa: PAULUS Editora, 2018.

Natal na Biblioteca




Uma vez mais, o Natal foi celebrado na Biblioteca Escolar da ES Gama Barros. Tudo começou com as decorações Natalícias. Este ano decidimos criar uma árvore de Natal com alguns dos livros do acervo da biblioteca. Com a colaboração da Assistente Operacional da BE/CRE e dos alunos monitores, criámos, também, pinheirinhos de Boas Festas que foram distribuídos a toda a comunidade escolar. As nossas renas trataram de tudo, não escapou ninguém.
Como Natal lembra solidariedade e amizade, a professora bibliotecária dinamizou a leitura do texto “Os Meus Amigos Refugiados” no Jardim das Leituras. A turma 7.ª do 7.º ano preparou uma leitura dramatizada deste texto para os seus colegas do 5.º 6.ª. Antes e após a leitura houve apontamentos musicais dinamizados pela professora de Educação Musical e por alunos do 6.º ano.
Muita alegria, leitura e animação na Biblioteca nesta Festa de Natal. A todos Boas Festas!