Maqueta do edifício onde funcionava a empresa de Otto Frank na Prinsengracht. Em primeiro plano, as traseiras do edifício onde se situava o Anexo Secreto. |
À semelhança de anos letivos
anteriores, o mês de janeiro é, também, o “mês de Anne Frank” na Biblioteca
Escolar da EBS Gama Barros.
É habitual a professora
bibliotecária dinamizar, em parceria com os docentes de Português do 8.º ano de
escolaridade, uma sessão de enquadramento ao “Mundo de Anne Frank” que permite
conhecer um pouco o contexto histórico em que viveu esta jovem adolescente e
perceber as razões que levaram esta família e as restantes quatro pessoas a
refugiarem-se, durante dois anos, num anexo, sem nunca de lá poderem sair.
A sessão passa pelo
conhecimento do espaço do anexo, quer através da maqueta existente na
biblioteca, quer através da visita virtual possível através do site oficial do Museu
Anne Frank em Amesterdão. A professora bibliotecária não deixa, também, de
explorar com @s alun@s as capas de diferentes edições do Diário e de partilhar
fotografias da família Frank e outros documentos que permitem conhecer todo o
background histórico-cultural que conduziu à eclosão da 2.ª Guerra Mundial, com
particular destaque para a política anti-semita de Hitler, que se foi
consubstanciando numa perseguição cada vez mais feroz aos judeus.
Pormenor da maqueta onde se pode ver a estante falsa que ocultava a passagem para o Anexo Secreto |
Pormenor do quarto de Anne Frank no Anexo Secreto. Atualmente, apenas se pode ver tudo o que Anne deixou nas paredes do quarto. |
Corte transversal do edifício que permite ver as divisões que faziam parte do Anexo Secreto
Livros e filmes em destaque na Biblioteca Escolar |
A sessão é
complementada com a leitura de alguns excertos do Diário, da versão em Banda
Desenhada, que suscita muito interesse por parte dos alunos mais novos. No
final da aula, partilha-se um excerto do livro “Sobrevivi ao Holocausto” de
Nanette Blitz Konig, amiga de Anne Frank, nomeadamente o excerto em que ela
relata o seu encontro com Anne no campo de concentração de Bergen Belsen, pouco
tempo antes da sua morte.
Desta vez, partilhamos contigo
as páginas do Diário escritas precisamente a 30 de janeiro de 1943, já alguns
meses depois da entrada no anexo secreto:
“Sábado, 30 de janeiro
de 1943
Querida Kitty,
Estou a ferver de
raiva, no entanto não posso mostrá-lo. Apetecia-me gritar, bater o pé, dar um
bom abanão à Mamã, chorar e nem sei que mais, por causa das palavras
desagradáveis, olhares trocistas e acusações que ela me lança dia após dia, que
me perfuram como setas lançadas por um arco, quase impossíveis de arrancar do
corpo. Gostava de gritar à Mamã, a Margot, aos van Daans, a Dussel e também ao
Papá:
- Deixem-me em paz,
deixem-me ter pelo menos uma noite em que não chore até adormecer, com os olhos
a arder e a cabeça a latejar. Deixem-me fugir, fugir de tudo, fugir deste
mundo!
Mas não posso fazer
isso. Não posso permitir que eles vejam as minhas dúvidas, ou as feridas que me
infligiram. Não suportaria a sua simpatia ou o seu escárnio bem-humorado. Isso
só me faria querer gritar ainda mais.
Todos pensam que me
estou a exibir quando falo, que sou ridícula quando me calo, insolente quando
respondo, matreira quando tenho uma boa ideia, preguiçosa quando estou cansada,
egoísta quando como mais uma dentada do que devia, estúpida, cobarde,
calculista, etc., etc. Todo o dia não ouço outra coisa a não ser que sou uma
criança exasperante e, embora eu me ria e finja não me importar, importo-me.
Gostava de poder pedir a Deus que me desse outra personalidade, uma
personalidade que não antagonizasse toda a gente.
Mas é impossível. Estou
limitada ao carácter com que nasci, e contudo tenho a certeza de que não sou
uma pessoa má. Faço o meu melhor para agradar a toda a gente, mais do que lhes
passaria pela cabeça num milhão de anos. Quando estou lá em cima, tento rir,
porque não quero que vejam os meus problemas.
Mais do que uma vez,
depois de uma série de censuras absurdas, retorqui à Mamã:
- Não me importa o que
dizes. Porque é que não desistes de mim? Sou um caso perdido.
Claro, ela diz-me que
não lhe responda torto e ignora-me praticamente durante dois dias. Depois, de
repente, é tudo esquecido e volta a tratar-me como aos outros.
Para mim, é impossível
ser toda sorrisos num dia e veneno no outro. Prefiro pensar que no meio é que
está a virtude, embora não seja assim tão virtuosa, e guardar os meus
pensamentos para mim própria. Talvez um destes dias trate os outros com o mesmo
desdém com que me tratam a mim. Oh, quem me dera poder fazê-lo!
Tua, Anne”
In Frank, A. (2019). O Diário de Anne Frank. Livros do Brasil.
Capa da edição comemorativa dos 75 anos da publicação de "O Diário de Anne Frank"